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domingo, 24 de outubro de 2010

Caros, não sou muito de fazer proselitismo político pela internet. Mas às vezes não dá pra resistir.
Maria Rita Kehl, uma das maiores psicanalistas do país, acabou de ser demitida de um dos jornalões do país – o Estado de São Paulo. A oposição e a mesma mídia argumentam que o “pluralismo”, a “liberdade de imprensa”, a “liberdade de expressão” estão em perigo. A mesma mídia e a oposição, a quem ela descaradamente apóia, e que a comprou a peso de ouro (ver as verbas que o Serra lhe destinou). Liberdade, sim, pra uns. O resto, favor calar o bico. A razão da demissão: uma crônica que Maria Rita escreveu. Reproduzo um trecho:
“Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.”
Conhecemos o discurso a que ela se refere. A Dilma estaria na frente por conta dos votos dos “rincões” mais atrasados deste país. E equaciona-se miséria econômica com miséria mental.
Sim, em termos regionais, a Dilma está na frente apenas no nosso querido nordeste (tomo a liberdade da primeira pessoa do plural). Mas o discurso esquece que no SE, NO e CO, há praticamente um empate técnico. E o Serra só está à frente no SU – não por acaso onde o país tem os melhores IDH.
Estou agora em Canaan, distrito perdido nos confins do Trairi, município perdido nos confins do Ceará, estado perdido nos confins do Nordeste. Onde mesmo?!... Ah, no Nordeste...
Permito-me um depoimento pessoal. Conheço Canaan há 46 anos. Lá fizemos uma casinha, nosso refúgio tropical. Estagnado até oito anos atrás. Que coincidência... Hoje, a dinâmica econômica do distrito impressiona pelo número de novos estabelecimentos, pelo movimento na praça da igreja (de cara nova), pelo dinheiro que corre, pelas motos que substituíram os jumentos. Bom pra eles, coitadinhos. Agora, só fazem passear pelas bordas das dunas, ociosos, onde têm uma graminha pra comer. Foram libertados para se virarem por conta própria. Pois é, quando Canaan muda...
Decerto essas mudanças não são tão perceptíveis para nós urbanóides, habitantes das metrópoles, que nos damos conta delas, mudanças, mais mediante números frios que pelos sete buracos de nossa cabeça.
Mas nem tanto só por números frios, para quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir. Minha experiência recente no CNPq mostrou como explodiram (não implodiram...) os recursos para ciência e tecnologia. E a ampliação das universidades públicas federais, estagnadas de pires na mão há tanto tempo, devia falar por si própria – particularmente para nós, que nelas labutamos.
Não, isso não conta. A guerra é moral – voltamos à Idade Média num fundamentalismo religioso, entre outros, que faria as delícias de Bush/Blair (a propósito, por favor lembrem-se que os verdes internacionais defenderam a guerra contra o Iraque). Confesso não dispor de um corruptômetro. Não saberia dizer se a corrupção é menor ou maior neste que em governos passados. É tolice ou sacanagem, negar a atual ou a passada. Desconfio que ela era maior nos governos passados, como os dados no final desta mensagem mostram, mas não faço disso um cavalo de batalha. Quando do mensalão do PT, me desfiliei do partido. Era o mínimo que poderia fazer. Agora, o gozado é que a mídia tem curiosa amnésia quanto ao mensalão do PSDB, quanto a FHC ter comprado a R$ 200.000,00 a cabeça a reeleição dele etc. etc. etc. (rememorem a lista dos escândalos ao final da mensagem).
A corrupção é endêmica neste país, é uma doença mais difícil de erradicar que a miséria econômica. Está na raiz mesma da estrutura do estado patrimonial / clientelístico brasileiro. Talvez eu seja acusado de cinismo, de defender uma “corrupção de resultados”... Não vou ficar bravo porque não é isso o que mais importa agora.
Com todos os problemas e contradições e alianças espúrias e Erenices da vida e corrupção etc. etc. etc. estamos numa encruzilhada apontando para dois países distintos: regressar ao capitalismo mais selvagem que conhecemos (que talvez esteja afundando na crise que se prolonga, mas nunca se sabe, o último fôlego desse gato já foi anunciado ad nauseum mas ele sempre tem mais um...), ou continuar num outro troço, inaugurado oito anos atrás, que ninguém ainda conseguiu definir com clareza, mas que é diferente. Paul Singer ousa dizer que estamos embarcando num novo modo de produção – o da economia solidária. Sei não, talvez seja exagero, talvez não, é cedo pra dizer. Decerto é outro o estado e o seu papel – estado que assume uma responsabilidade social, que dá crédito farto principalmente para quem nunca teve acesso a ele, que utiliza recursos públicos para fins públicos, não para financiar empresas internacionais no processo de privataria... No máximo, estamos vendo a geração de um novo modo de produção, como quer otimistamente Singer, mas no mínimo estamos testemunhando um estado que compensa minimamente as mazelas do capital. Ou isso não importa? Dizia Betinho: quem tem fome tem pressa – é uma questão de vida ou morte. Estamos, sim, testemunhando uma revolução pacífica talvez sem precedentes.
Caros, relutei em escrever essa mensagem. Mas não fiquei em paz enquanto não o fiz. Portanto, lá vai. Não sei as posições de todos sobre o tema. Mas queria que, pelo menos, vocês soubessem da minha, nesta forma menos pública (publicamente, assinei um “manifesto de intelectuais” – sei lá se mereço o título – em favor da candidatura da Dilma cuja iniciativa está sendo coordenada por Emir Sader, uma das mentes mais lúcidas deste país).
Grande abraço,
Professor Fernando Holanda

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