O dito cantor e compositor popular Caetano Velloso é, reconhecidamente, uma pessoa controversa, paradoxal e ambígua. Se, na sua criação artística tais características produziram obras de indiscutível valor para a música brasileira, o mesmo não podemos dizer quando se trata da sua postura enquanto sujeito político.
O pode-ser-não-mas-pode-ser, o é isso e ao mesmo tempo aquilo se justificava, na época da ditadura militar, por causa da forte censura sobre o livre pensamento no Brasil, a chamada “linguagem da fresta”. Hoje, porém, já somos um país que consolida dia a dia a sua democracia, o que permite há amplos setores da sociedade civil uma participação cada vez mais atuante nos desígnios políticos do país. As velhas oligarquias, os afetados pelo bacharelismo vão, cada vez mais, demonstrando sua face caduca, o que nos faz acreditar que o País da tropicália, definitivamente, está trilhando um caminho para um futuro socialmente menos desigual.
A eleição de um torneiro mecânico para presidente da República, por mais que discordem da postura política do Luis Inácio Lula da Silva, revela uma guinada das mais revolucionárias da história brasileira. E mais, numa terra governada desde os tempos imperiais pelos homens de “anel no dedo”, Lula é “formalmente” analfabeto.
Está claro, para todo mundo, que a exclusão dos iletrados da vida política brasileira era uma forma de manutenção de poder das velhas elites senhoriais, que sempre se sentiram patronas dos pobres, negros, mulheres, os ditos analfabetos.
A reação de tais setores discriminados, no entanto, sempre se fez sentir, quer de forma explícita, quer em recusas e resistências cotidianas. A música, ou melhor, o samba é um dos melhores exemplos desse desejo dos excluídos de defenderem a sua condição cidadã. A música popular brasileira, nunca foi propriedade exclusiva dos “doutos” compositores formados nos conservatórios europeus e dos capitães da mídia.
Muito pelo contrário, assistimos daqueles autores mais “doutos” um movimento de apropriação do legado produzido pelos marginalizados, visto a indiscutível qualidade desse nosso repertório cultural.
Ouvir, por que não sabemos ler, Caetano Velloso chamar o presidente Lula de analfabeto está na contramão de todo desejo de inclusão social que norteou as manifestações populares no Brasil. Ser analfabeto não é um defeito moral, mas uma forma de exclusão política, cidadão Caetano. É nojento, é hipócrita para a sua própria dita condição de artista popular; e mais ainda, é ofensivo ao povo pobre e negro desse País.
O Sr.Caetano Velloso devia fazer, em nome dos sambadores, dos capoeristas, das marisqueiras, dos pescadores, do povo do maculelê, dos quilombolas,dos favelados, dos migrantes e imigrantes, dos sem-terra, dos torneiros mecânicos, dos vendedores ambulantes, dos cordelistas, das vendedoras de acarajé, do povo do Iguape, enfim, de todos os côncavos e convexos historicamente discriminados na história brasileira uma retratação pública.
É inadmissível, em nome mesmo da democracia, atitudes excludentes e com claro acento fascistóide como essa do dito compositor popular. Caetano Velloso votaria num analfabeto de Santo Amaro, sua terra natal na Bahia?
Talvez o autor do verso “aprendê a lê pra ensiná meus camará”, apropriado pelo próprio autor?
É uma pergunta ingênua - “cafona” para usar o linguajar do sofisticado músico - mais ao mesmo tempo necessária a ser feita. Precisamos “ouvir” do letrado Caetano Velloso uma explicação mais clara de tal afirmação, porque do jeito que está, parece um xingamento a todo o povo brasileiro. Uma atitude “grosseira”!
ASSOCIAÇÃO DOS SAMBADORES E SAMBADEIRAS DO ESTADO DA BAHIA*
*ASSEBA, criada em 2005, é uma entidade que tem como missão: promover, apoiar, registrar e transmitir todo o legado do Samba de Roda, tendo como protagonistas do movimento, lideranças de 20 municípios da região do Recôncavo baiano. (asseba@gmail.com).
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